Manutenção em veículos Hibridos e Elétricos

Manutenção em veículos Híbridos e Elétricos

 

A manutenção em veículos eléctricos e híbridos é, por diversas razões, mais simples do que a manutenção realizada nos veículos tradicionais, leia-se, veículos com motor de combustão interna. Este artigo será focado na manutenção de veículos eléctricos e híbridos, no que se refere à componente eléctrica, e os requisitos de segurança necessários na intervenção.

 

A principal distinção na manutenção dos dois tipos de veículos é naturalmente o tipo de propulsão, sendo que no caso dos veículos híbridos, a maior simplicidade associada à manutenção, está diretamente relacionada com a componente eléctrica do veículo. Os benefícios da travagem regenerativa, a menor quantidade de componentes móveis e de fluídos em comparação aos veículos tradicionais, significa que existem menos custos de manutenção associados ao veículo eléctrico ou ao veículo híbrido.

 

Relativamente à travagem regenerativa, pelo facto do mecanismo recuperar energia cinética opondo-se ao movimento do veículo, a energia que se dissiparia pelos discos e pastilhas de travão é convertida em energia eléctrica e armazenada na bateria de alta tensão. Deste modo, é natural que não só o desgaste no sistema de travagem do veículo, como os custos associados, sejam substancialmente inferiores. Contudo, deve referir-se que isto não significa que deverá ser totalmente descorada a necessidade de manutenção no sistema de travagem, sob risco de colocar em causa a segurança dos ocupantes do veículo.

 

No que se refere aos fluídos, os equipamentos que compõe os veículos eléctricos e híbridos têm geralmente menor necessidade de terem fluídos associados ao seu funcionamento, não necessitando de manutenção associada. Deste modo, alguns contrutores tornam impossível o acesso aos fluídos, isolando-os e selando-os dentro da estrutura do veículo ou componentes. No entanto, à semelhança dos veículos tradicionais, os fluídos de refrigeração da bateria de alta tensão, os fluídos do sistema de travagem e ainda o depósito de líquido do limpa para-brisas, devem ser mantidos e verificados em qualquer procedimento de manuteção. Em alguns construtores, existem inclusivamente fluídos da caixa de velocidades que necessitam de ser substituídos períodicamente.

 

As baterias de baixa tensão ou baterias de 12V é um dos componentes que é comum a todos os veículos. Nos veículos eléctricos e híbridos esta bateria é essencial para garantir a alimentação do sistema de alta tensão e o funcionamento dos componentes acessórios do veículo, tais como algumas funções do computador de bordo, vidros, airbags e luzes interiores e exteriores. Não fazendo parte dos planos de manutenção desenhados pelos fabricantes, deve garantir-se a sua verificação.

 

A bateria de alta tensão não necessita de manutenção periódica. No entanto, sendo o componente responsável pela propulsão do veículo, é de extrema importância assegurar o seu correto funcionamento. Este componente tende a tornar-se menos eficiente com o passar do tempo, contudo, a intervenção na bateria de alta tensão é recomendável apenas quando o veículo exibe a mensagem de erro ou apresenta um comportamento anómalo. A intervenção na bateria de alta tensão consiste na substituição por uma bateria nova ou no teste e substituição das células individuais ou módulos internos da bateria.

 

Os exemplos apresentados permitem concluir que, em relação ao veículo tradicional, a manutenção é bastante mais simplificada pelo facto de serem menos os componentes que necessitam de ser substituídos ou intervencionados. Contudo, isto não significa que as competências de intervenção dos técnicos sejam dispensáveis. Ao nível da segurança durante a intervenção, também pela componente eléctrica dos veículos, os cuidados terão que ser redobrados afim de prevenir acidentes.

 

Ao contrário dos veículos tradicionais, a tensão eléctrica de trabalho da componente eléctrica dos veículos eléctricos e híbridos pode causar danos graves na saúde dos operadores. Em muitos sistemas as tensões eléctricas ascendem aos 600V. O perigo não resulta diretamente da tensão eléctrica mas sim da combinação da tensão eléctrica com outros conceitos eléctricos e características do meio de propagação, mais concretamente, da tensão eléctrica com a intensidade de corrente eléctrica, duração do efeito, da frequência e variação brusca da corrente, da pressão de contacto e da resistência do corpo humano. De acordo com a lei de ohm e conforme representa a Figura 1, a tensão eléctrica é igual à resistência de um corpo multiplicada pela intensidade de corrente que atravessa esse corpo. Neste sentido, uma tensão eléctrica elevada (V), combinada com uma resistência do corpo humano reduzida (Ω), significa uma intensidade de corrente eléctrica também elevada (I). Pelo contrário, quanto maior for a resistência de contacto com a terra (por exemplo, solas de borracha), menor é a corrente que atravessa o corpo. Posto isto, a gravidade dos danos corporais em caso de acidente é diretamente influenciada pela combinação destes fatores.

 

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Figura 1 - Lei de ohm

 

Os acidentes com a eletricidade podem ser evitados se na intervenção forem tomadas precauções. O operador deverá realizar os procedimentos evitando o contacto com partes ativas dos materiais ou aparelho eléctrico e evitando contactos com massas que acidentalmente fiquem sob tensão. Posto isto, deverão ser tomadas medidas no sentido de:

 

  • Não tocar em elementos nús de uma instalação elétrica;
  • Verificar se os isolamentos estão em bom estado; mas não danificar o isolamento dos fios e cablagens;
  • Não puxar pelos cabos alimentadores dos circuitos para os desligar;
  • Não efetuar ligações improvisadas.

 

Para além dos cuidados comuns, a formação do operador e a utilização de equipamento de proteção individual, daqui em diante “EPI”, são essenciais.

 

A intervenção em componentes específicos de alta tensão só deve ser realizado por técnicos com o nível 3 de formação em média e alta tensão. 

 

No que se refere aos EPI, a intervenção em componentes específicos de alta tensão requer a utilização de equipamentos isolados e com resistência eléctrica elevada. Estes equipamentos deverão ser normalizados e substituídos sempre que algum deles estiver danificado.

 

Devem ser utilizadas luvas isoladas classe 0, certificadas para 1 ano de utilização. Isto significa que a data da primeira utilização deverá ser registada de forma a garantir que a validade não é ultrapassada. 

 

A botas de segurança fazem parte dos EPI, estas deverão garantir a certificação de acordo com a norma SP3. Neste contexto, as botas de segurança não podem ter qualquer componente metálico e as sola e biqueira deverão ser contruídas em Kevlar ou outro material não condutor.

 

Ainda no âmbito da segurança do operador, os óculos/viseiras são necessários para prevenir arcos eléctricos e compostos químicos da bateria e deverão ter proteção anti-embaciamento.

 

Como complemento aos EPI, o operador deverá seguir os procedimentos e utilizar ferramentas que reforçem a segurança pessoal e que garantam a desenergização do veículo.

 

A ferramenta isolada a 1000V, deverá garantir resistência eléctrica necessária ao operador para que este possa desmontar e montar componentes do sistema de alta tensão. 

 

À semelhança da ferramenta, também as mantas ou tapetes isolantes funcionam como complemento aos EPI. A manta isolante deverá garantir propriedades isolantes até 1000V e, no caso do tapete, utilizado para veículos sinistrados, intervenções em bancadas ou avarias que indiciem problemas nos sistemas eléctricos, deverá garantir isolamento até 50000V.

 

Em caso de acidente de electrocussão, deve utilizar-se a vara de resgate. Esta ferramenta é utilizada para retirar o operador que está em choque e deverá ser composta de um material não condutor e com comprimento suficiente para não ocorrer arco eléctrico.

 

No que se refere ao veículo, antes de iniciar a intervenção em qualquer componente de alta tensão é necessário colocar o veiculo em segurança, respeitando as operações mencionadas em seguida.

 

A colocação de sinalética e a vedação da área de trabalho são os procedimentos que iniciam a intervenção no veículo. De acordo com a Figura 2 devem ser colocadas placas de avisos de perigo retrorrefletoras e homologadas para o efeito em redor do veiculo sempre que se proceder a trabalhos na componente de alta tensão. A área de trabalho em redor do veiculo deverá ser delimitada a, pelo menos, 1,2m do veículo com pinos, correntes e bases plásticas, as últimas devem ser vermelhas e brancas e não serem suportadas por água ou outro material condutor.

 

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Figura 2 - Vedação da área de trabalho

 

Durante a intervenção propriamente dita, deverão ser seguidos os procedimentos de segurança com o intuito de desernegizar o veículo. É de extrema importância que os procedimentos sejam realizados pela seguinte ordem:

 

  1. Desligar a ignição e remover a chave da zona de deteção do sistema Smart Key (se aplicável);
  2. Desligar o cabo negativo da bateria auxiliar/serviço;
  3. Utilização dos equipamentos de segurança (luvas isoladas e calçado);
  4. Localizar e remover ficha de segurança (Safety lock) (consultar manual do veiculo);
  5. Aguardar cerca de 10 a 15 min ou mais de modo a descarregar os condensadores de alta capacidade do inversor;
  6. Medir a tensão ao terminais do inversor – verificação 0V;
  7. Isolar o conector de alta tensão com fita isoladora.

 

A ficha de segurança da alta tensão está em diferentes localizações em função dos vários construtores de automóveis. Convencionou-se que todos os cabos de alta tensão e fichas de segurança são identificadas a cor laranja

 

Ao nível da manutenção, através dos exemplos referidos anteriormente torna-se inequívoco que o após-venda do futuro terá que reconfigurar a estrutura oficinal e repensar os procedimentos de intervenção nas viaturas. As caracterísiticas dos sistemas levam à necessidade de adequar os recursos, formando-os sobre as especificidades de cada componentes eléctricos e, sobretudo, sobre os procedimentos de segurança que devem ser assegurados durante a intervenção.